Estudo pioneiro indica potencial microbiológico do solo da Mata dos Godoy 17/12/2019 - 11:10

Visitar o Parque Estadual da Mata dos Godoy, no distrito de Espírito Santo, a cerca de 20 km de Londrina, é uma oportunidade para ter contato com a natureza e encontrar variedades de plantas, árvores e animais. O que os visitantes nem imaginam é que no solo onde pisam há milhares de organismos vivos, invisíveis ao olho nu, que impressionam pela variedade e utilidade. Para identificá-los, um projeto de pesquisa do Departamento de Biologia Geral fez o primeiro estudo da diversidade dos microrganismos que habitam o solo da Mata e as camadas de folhas depositadas nele (serrapilheira). Com a pesquisa, foram identificados fungos e bactérias com potencial biotecnológico para utilização em combustível, cosméticos e na agricultura.

O projeto "Estudo metagenômico e bioprospecção de microrganismos com potencial biotecnológico celulolítico provenientes de amostras de solo do Parque Estadual Mata dos Godoy em Londrina-PR" é coordenado pelo professor Fernando Gomes Barcellos, do Departamento de Biologia Geral, do Centro de Ciências Biológicas (CCB), e resultou em pesquisas de doutorado, mestrado e especialização.

Para fazer o levantamento, amostras do solo, que é resquício de Mata Atlântica, foram levadas para o Laboratório de Genética de Microorganismos, no CCB. O estudo identificou, por exemplo, que a composição da microbiota do solo tem características semelhantes com a de outras unidades florestais do país, e das Américas do Sul, Central e do Norte, inclusive também da Floresta Amazônica. Segundo o professor, existe um grupo de bactérias comum entre essas unidades florestais, o que caracteriza um padrão entre elas.

Na Mata dos Godoy, estudaram o material genético das bactérias a partir do gene que codifica para a molécula 16S, um RNA sintetizado pela célula que faz parte do ribossoma, onde é sintetizado as proteínas da célula e funciona como uma espécie de marcador filogenético. Com isso, sequenciaram todas elas, identificaram e conseguiram estudar dois filos de bactérias, Acidobacteria e Proteobacteria. Isso foi possível por meio da técnica de Metabarcoding, que identifica sequências curtas do gene que codifica para a molécula do 16S. O professor conta que a maior comunidade encontrada de bactérias, mas também existem fungos no solo e na serrapilheira.  
As análises identificaram as enzimas desses microrganismos, ou seja, substâncias protéicas produzidas pelo organismo, com função catalisadora nas reações químicas, para que estas ocorram de forma eficiente. A enzima proveniente da bactéria é a celulase. A enzima que vem do fungo é a lacase. Ambas são utilizadas para degradação de fibra vegetal e produção de álcool de 2ª geração - aquele proveniente de restos vegetais. Os vegetais possuem fibras, que são compostas por celulose e lignina, dentre as enzimas necessárias para degradá-las estão, justamente, as celulases e as lacases.

Para o professor, este é considerado um grande potencial da microbiota da Mata dos Godoy. "Isso poderia fornecer um combustível mais barato e gerar produtos farmacêuticos mais baratos, por causa da produção de enzimas, que degradam fibras vegetais, e são usadas nesses produtos", afirma. Essa microbiota apresenta ainda potencial biotecnológico que tem utilização na agricultura, porque pode atuar no crescimento da planta, controle biológico de pragas agrícolas, fixação biológica do Nitrogênio, entre outros.

Como no solo se encontram milhares de bactérias e fungos não cultiváveis, outra técnica utilizada para identificação se baseia em programas de Bioinformática, com acesso ao DNA em banco de dados já existentes. Segundo o professor, ela é muito confiável. "Se aponta algo, fazemos o experimento e confirmamos com os testes de bancada", afirma. Uma das coisas apontada na Bioinformática foi o potencial metabólico dos fungos e bactérias da Mata dos Godoy, que causou até certo espanto no pesquisador.

Pesticidas - No metabolismo microbiano, foi possível identificar que existe capacidade de metabolizar agrotóxico. Segundo Fernando, isso significa que "tem agrotóxico por lá, o que assustou a gente". A pesquisa mostra que há presença de pesticida no solo da mata, proveniente de plantações que estão ao redor. Para o professor, isso aponta que existe influência externa na mata, principalmente da agricultura.

O pesquisador explica que, com a chuva, a água passa pelas plantações e chega até a Mata. Foram estudadas as condições em que há bastante chuva e pouca chuva, o que faz variar a quantidade bactérias no local. Porém, ele afirma há possibilidade de resolver o problema e de forma até simples: criar barreiras de contenção nas bordas da mata e fazer buracos para barrar a entrada da água contaminada.

Fernando Barcellos explica que este é só o começo das pesquisas, pois a Mata dos Godoy é apenas um fragmento, com potencial para ser comparado a outros fragmentos florestais da Região Sul. Além disso, há interesse em parcerias futuras com indústrias para utilização desse fungo e também das bactérias para aplicações em produtos comerciais.
 

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